Estudantes desenvolvem aplicativo que permite avaliar o nivel da dor em animais

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O aplicativo será gratuito, para que mais pessoas, não apenas médicos veterinários, possam aprimorar a avaliação de dor, o atendimento e a qualidade de vida dos animais atendidos

 

Animais de estimação podem precisar passar por cirurgias, desencadeando processos dolorosos de diferentes intensidades. Mas, ao contrário dos seres humanos, os animais não são capazes de relatar a intensidade da dor que sentem em uma situação como essa. Essa preocupação levou um grupo de estudantes da Universidade Estadual Paulista, campus de Botucatu, coordenado pelo professor Stelio Luna, a desenvolver um aplicativo para avaliar a dor nos animais, em tempo real, com base em escalas de dor já desenvolvidas e validadas. A ferramenta, ainda em fase de aperfeiçoamento, é resultado de uma parceria com a Cesar School, escola de inovação e centro de educação, ligada ao Porto Digital, em Recife. O aplicativo será gratuito, para que mais pessoas, não apenas médicos veterinários, possam aprimorar a avaliação de dor, o atendimento e a qualidade de vida dos animais atendidos.

As escalas de avaliação de dor que vêm sendo desenvolvidas pelo grupo coordenado por Luna são eficientes na avaliação de dor em diversas espécies de animais. A equipe já fez experimentos com bois, cavalos, entre outros, mas o aplicativo, até o momento, está disponibilizando apenas as escalas de dor para gatas que passaram pela cirurgia de castração, escala já desenvolvida e validada pelo grupo de Luna e que foi publicada na revista BMC Veterinary Research, em 2013. Para avaliar a dor em diferentes situações, como cirurgias de vários tipos e mesmo dor crônica, será preciso desenvolver e validar novas escalas. Para cada tipo de dor e animal será desenvolvida uma escala diferente. 

O aplicativo poderá ser utilizado tanto em celulares quanto em computadores, desde que o aparelho tenha conexão com a internet. Funciona de forma bem simples, com base em uma escala para avaliar dor. No momento, apenas para gatas castradas, diretrizes do aplicativo indicam para o usuário como observar características específicas do animal após a cirurgia, tais como postura, nível de atividade, atitude, apetite e pressão arterial. Ele, então, vai registrando as respostas que melhor refletem o estado do animal. 

Em seguida, o aplicativo gera uma pontuação que reflete dor leve, moderada ou intensa e indica se a utilização de analgésicos é recomendada. “O aplicativo disponibiliza a escala para o usuário avaliar a dor do animal e calcular qual é seu nível de dor, sempre deixando claro que a avaliação clínica pelo médico veterinário deve prevalecer”, comenta Marianna Guerreira, bióloga e médica veterinária que desenvolve o projeto sob orientação de Luna. Ela explica ainda que, caso o usuário tenha dúvidas sobre qual resposta assinalar, ele pode assistir vídeos com exemplos dos comportamentos das gatas que o aplicativo disponibiliza, e fazer uma escolha mais orientada.

O aplicativo é uma ferramenta prática e confiável que vai ampliar o acesso às informações sobre processos dolorosos nos animais. Embora o público-alvo seja inicialmente os profissionais de saúde animal, o aplicativo não requer nenhum treinamento prévio, propiciando que tutores ou tratadores dos animais também façam uso da  nova ferramenta. “O aplicativo vai popularizar ainda mais a informação já disponível no site Animal Pain do nosso grupo, tornando mais prática a avaliação da dor nos animais pelas pessoas em tempo real, ou seja, se aquele animal no momento requer resgate analgésico ou não”, aponta Luna. 

 

Inédito, o aplicativo poderá ser adotado em diferentes países. De acordo com Luna, a ideia é que a ferramenta traga dados do mundo todo, de diferentes culturas e línguas, gerando um banco de dados bastante rico sobre escores de dor dos animais. O site Animal Pain já é disponibilizado em três idiomas – português, espanhol e inglês – e conta com mais de 65 mil acessos até o momento. A expectativa é de que, com a ampliação do uso,  tradução do site para outras línguas e introdução de escalas de dor de outros animais, a ferramenta se torne cada vez mais conhecida. 

Trabalho em conjunto – A parceria com a Cesar School teve início há dois meses, e foi fundamental para o sucesso do projeto ao agregar conhecimentos de programação. “A ideia do aplicativo é antiga, mas ainda não tinha sido colocada em prática”, comenta Luna. 

O contato foi feito pela Marianna, que já tinha trabalhado com a  escola de inovação que é ligada ao Porto Digital, um dos principais parques tecnológicos do país. O objetivo deles é formar profissionais inovadores, capazes de resolver problemas reais. A escola utiliza o método PBL – Problem-Based Learning, e para isso, eles buscam parceiros para desenvolver soluções tecnológicas em vários campos. 

Uma das matérias oferecidas no programa de mestrado da instituição é chamada de Fábrica de Software. Ali os alunos desenvolvem soluções a partir de demandas recebidas da sociedade. Houve um grande interesse da Cesar School em desenvolver o aplicativo após a apresentação do desafio aos alunos e um deles assumiu o projeto. Para a construção do aplicativo, os pesquisadores do grupo da Unesp cederam as filmagens dos animais produzidas durante os experimentos científicos das escalas. 

Planos – A primeira versão do aplicativo aborda apenas a escala de avaliação de dor para gatas operadas em cirurgia de castração, que já está disponível no site Animal Pain. Porém, a ideia é adaptar a ferramenta para escalas de avaliação de dor em outros animais e em outras situações. De acordo com Luna, esse aplicativo vai servir como um piloto para todas as outras escalas de avaliação de dor em animais que seu grupo vem desenvolvendo, incluindo jumentos, bovinos, ovinos, coelhos e outras espécies. “Já estamos trabalhando em um aplicativo para dor em suínos. A ideia é diversificar as escalas para disseminar seu uso”, comenta Marianna. A tecnologia está em fase final de testes numa clínica veterinária especializada em felinos e deve ser lançada em breve, em oito línguas. 

Por Caroline Marques Maia

Foto: Mariana Lira