Docente da Faculdade de Medicina de Botucatu faz balanço dos cinco meses de pandemia de covid-19

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Para o especialista “o grande problema da pandemia é que não houve uma resposta única, uma resposta nacional, havendo muita turbulência em relação aos discursos e infelizmente a gente não consegue isolar de forma correta a população, então não temos o isolamento necessário”
 

Há cinco meses a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou pandemia do novo coronavírus (SARS-COV-2). De lá para cá o Brasil atingiu a marca de mais de 100 mil mortos e mais de 3 milhões de pessoas foram infectadas. Esses números poderiam ser menores? A estratégia governamental falhou? A população se descuidou? Quando teremos uma vacina? O que esperar para os próximos meses?

Para responder estes questionamentos, a Assessoria de Comunicação e Imprensa (ACI) da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB|Unesp) ouviu o médico infectologista e chefe do Departamento de Infectologia, Dermatologia, Diagnóstico por Imagem e Radioterapia, Dr. Alexandre Naime Barbosa.

Assessoria de Comunicação e ImprensaO Brasil ultrapassou a marca de 100.000 mortos e mais de 3 milhões de infectados pelo novo coronavírus. Na sua avaliação, o que é necessário fazer p/ evitarmos mais mortes até o fim de 2020?

Alexandre Naime Barbosa – Precisaríamos de um grande planejamento nacional, de uma diretriz muito séria em relação a prevenção, diagnóstico e isolamento dos casos confirmados. O grande problema da pandemia é que não houve uma resposta única, uma resposta nacional. Houve muita turbulência em relação aos discursos e infelizmente a gente não consegue isolar de forma correta a população, então não temos o isolamento necessário. Não estamos testando adequadamente, em termos nacionais, o número de pessoas que deveriam ser testadas e com o teste correto (coleta de swab por RT-PCR). Infelizmente a população fica nesse fogo cruzado de informações que tem uma motivação política e não consegue uma diretriz assertiva em relação a prevenção da COVID-19. O que precisamos é de um planejamento de isolamento social, prevenção em relação as medidas de redução de risco (uso de máscara, distanciamento social e higienização das mãos), uma política séria de testagens de exames adequados e isolamento dos casos suspeitos.

 

O Brasil já realiza testes com duas vacinas (ensaio clínico – fase 3). Neste momento é possível verificar avanços ou ainda é pré-maturo qualquer afirmação sobre eficácia?

Em relação as duas vacinas que estão sendo testadas no Brasil ou qualquer outra iniciativa, é completamente pré-maturo avaliar qualquer tipo de resultado ou eficácia. Eles só vão ficar prontos assim que tivermos a finalização dos ensaios na fase 3 (momento atual). As fases 1 e 2 mostraram que o produto é seguro, não tem efeitos colaterais graves e moderados, então são medicações toleráveis (não tem reações adversas graves). São vacinas produzidas com vírus morto, inativo, portanto não é esperado que tenha efeitos adversos mais sérios e agora temos que esperar os resultados destes estudos de fase 3 sem querer antecipar os resultados e falar de lançamento da vacina para o final do ano ou antes disso porque é necessário que as etapas fundamentais do estudo sejam concluídas sem pressa, senão podemos colocar no mercado uma vacina que não tenha eficácia real.

 

A vacina é o único antídoto capaz de neutralizar a ação do novo coronavírus?

Não, a vacina não é o único produto capaz de inativar o SARS-COV-2. Muitas outras drogas já estão em estudo com pessoas que têm a doença. A vacina é para impedir que a pessoa se contamine. Uma medicação usada contra a COVID-19, um antiviral, por exemplo, seria para impedir a progressão naquelas pessoas que já têm. Mas não tem nenhuma droga que mostre eficácia no impedimento do desenvolvimento da doença em quem está infectado. Ou seja, as duas coisas têm que acontecer – o estudo da vacina e o estudo das drogas que possivelmente atuam contra a COVID-19.

 

A partir do momento em que tivermos a vacinação em massa, poderemos retomar a rotina como antes num curto espaço de tempo? (Por exemplo com realização de eventos e situações que geram aglomerações)

A vacina depende muito dos resultados. Se tivermos uma vacina com uma dose que imunize com alto poder até é possível que a gente consiga voltar a vida normal rapidamente. Mas talvez seja necessário aplicar mais de uma dose da vacina ou doses anuais, periódicas. Então, enquanto não entendermos como funciona a proteção da vacina não dá para prever o futuro. Se ela for uma vacina muito eficaz em apenas uma dose, o retorno à normalidade será num período mais curto. Se forem necessárias mais doses ou uma imunização recorrente ainda teremos que passar por essa adaptação de novo normal por um bom tempo.

 

Temos notado um afrouxamento do distanciamento social por parte da população (em certos casos com aglomerações). Na sua avaliação, a que se deve esse cenário?

É necessário tentar educar a população com um planejamento único, algo que nunca teve (política nacional e integrada de combate e prevenção ao SARS-COV-2). A população sempre ouviu discursos distintos, por isso que ela não leva em consideração, não dando importância e afrouxando as medidas.

 

Até que tenhamos a imunização da população contra o coronavírus, como devemos proceder em relação a higienização e uso de máscaras para evitar o contágio?

Para se adaptar até a chegada da vacina, nós temos que atentar para quatro passos.

. Sair de casa o mínimo possível somente com necessidades mais fundamentais e, sempre que o fizer, usando máscara.

. Mesmo usando máscara, ao ter contato extra familiar/domiciliar, manter o distanciamento social (1,5m a 2m de outra pessoa).

. Higiene frequente das mãos com água e sabão (caso não tenha, usar álcool em gel) – recordando de não levar as mãos aos olhos, nariz e boca.

. Se tiver doente, com sinal ou sintoma de resfriado ou gripe, não sair de casa porque os indivíduos sintomáticos são os que mais transmitem.

 

Vinicius Dallaqua dos Santos
Assessoria de Comunicação e Imprensa da FMB|Unesp