Sebastião Pires Ferreira Filho: "Doença é de origem bacteriana e atinge pessoas de todas as faixas etárias"
Trabalhadores rurais e os profissionais que fazem o armazenamento de grãos possuem maior risco, mas outras pessoas também estão expostas à doença, como os veterinários e quem lida diretamente com a venda e a criação de animais
Nos últimos dias, o excesso de chuvas trouxe muitos transtornos a diversos Estados brasileiros, deixando pessoas desabrigadas, casas destruídas e cidades cobertas de água. Além dos prejuízos humanos e materiais, os deslizamentos de terra e as grandes inundações contribuem para a proliferação de doenças transmitidas pela água, como a leptospirose.
Segundo o médico infectologista e vice-coordenador do Centro de Referência de Imunobiológicos Especiais (CRIE) e do Núcleo Hospitalar de Epidemiologia (NHE) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HCFMB), Dr. Sebastião Pires Ferreira Filho, a leptospirose é de origem bacteriana, atingindo pessoas de todas as faixas etárias e pode ser contraída além do período chuvoso.
“Diariamente, os trabalhadores rurais e os profissionais que fazem o armazenamento de grãos possuem maior risco, mas outras pessoas também estão expostas à doença, como os veterinários e quem lida diretamente com a venda e a criação de animais. A bactéria da leptospirose é normalmente encontrada na urina do rato, mas pode estar também em cachorros, gatos, bovinos e eqüinos”.
Mas qual é a razão da maior incidência de casos de leptospirose em períodos chuvosos, principalmente no verão? Dr. Sebastião explica que, a partir da grande quantidade de chuva, o material potencialmente contaminado é redistribuído e fica mais diluído na água, alcançando uma maior parte da população. “Quando as enchentes acontecem, a água carrega com ela lixos e urina de alguns animais, e é neste momento que o ser humano pode se contaminar”.
Dados apontam que, em 2020, foram registrados 40 mil novos casos de leptospirose no Brasil, mas existe uma parcela de subnotificação de diagnósticos, pois os sintomas leves da doença – febre, dores no corpo e indisposição – são semelhantes aos de outras enfermidades. Dr. Sebastião alerta que a leptospirose também pode evoluir para situações mais graves, levando à morte.
“A doença pode evoluir para o que chamamos de icterícia: os pacientes ficam amarelados, mais prostrados e muitos órgãos podem ser afetados, como fígado, rim e até mesmo a falência múltipla dos órgãos. Por isso, quando houver contato com água da chuva e começarem a aparecer estes sintomas, deve-se procurar rapidamente assistência médica. A leptospirose tem cura e o tratamento é realizado por antibióticos, com duração de 7 a 12 dias”.
Neste momento de significativas mudanças climáticas, as medidas preventivas são fundamentais para evitar a contaminação. O médico infectologista do HCFMB cita três atitudes importantes que podem dificultar o contágio:
– Evitar contato com água de enchentes e materiais contaminados, sempre que possível;
– Quando o contato for imprescindível, usar botas de cano longo e roupas impermeáveis para dificultar a penetração da bactéria no organismo;
– Para realizar a limpeza de locais suspeitos de contaminação, utilizar Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), como luvas e botas.
Os cuidados também se estendem aos voluntários que ajudam na limpeza e reconstrução de locais atingidos pelas enchentes. “Muitas pessoas se dedicam em ajudar as pessoas, e isso é maravilhoso. Porém, é necessário cuidado para que eles não se exponham a riscos, sempre se perguntando quais são os prováveis riscos presentes e as formas de prevenção, para exercer a solidariedade com segurança”.
Dr. Sebastião lembra que, além da leptospirose, a água das enchentes pode trazer outras doenças, como hepatite A e surtos de diarréia, principalmente em crianças. Após as chuvas e com o possível acúmulo de poças de água parada, podem surgir casos de dengue, zika vírus e chikungunya. “Os reflexos das doenças relacionadas às enchentes podem ser sentidos na saúde pública. Por isso, a prevenção e o auto-cuidado devem ser sempre priorizados”, encerra.
Por – Maíra Masiero